PÁGINAS

A GUERRA NO RIO

A polícia, e os restos humanos pelos quais ninguém se interessa.
Tenho, como quase todos os brasileiros, incluindo aí os traficantes do Rio de Janeiro, acompanhado o que a televisão vem chamando de Guerra no Rio. Vejo com muita preocupação o desenrolar dessa tragédia. Primeiro, como "bom cidadão" não nego a necessidade de uma intervenção ostensiva do Estado nas mazelas que aflinge o Rio de Janeiro. O problema é que a Guerra no Rio é uma guerra travada contra o próprio Estado.

Não é o Estado de direito, dentro da concepção moderna de Estado que se faz presente, e que é objeto dessa guerra travada no Rio não só tendo os traficantes como personagens, mas também boas pessoas que trabalham e que, deixam de ir ao trabalho, para protestar contra a polícia corrupta que lhes fere cotidianamente. É o Estado doente, o Estado que não protege, que não oferece ensino de qualidade, que não gera emprego, e que não é bem servido porque suas forças de coersão têm controle próprio, ou seja, não servem ao Estado, mas aos seus próprios interesses.

Vamos pensar um pouquinho. Onde tem drogas tem dinheiro. Bandido não assina um cheque para comprar drogas e drogas não são pagas com cartão de crédito. Assim, geralmente, onde se esconde a droga, esconde-se também o dinheiro. Então, porque entre tantas descobertas de droga, até o momento, não se falou em nenhuma descoberta de dinheiro escondido? Sairam os bandidos carregando fardos de dinheiro? (digo fardo, porque para negociar tanta droga como a que já foi apreendida, são necessários fardos de dinheiro) Bom, se carregavam sacos de dinheiro, isso ainda não foi noticiado afinal, graças ao pioneirismo da Rede Globo advindo dos tempos de colaboração com a ditadura, ela estava lá, com os agentes do Estado, mostrando aqueles homens de preto pondo a turma do tráfico pra correr. E não vi nenhum saco de dinheiro.

Mas, apesar de toda a mídia construindo a imagem da polícia como tropa de heróis, ainda houveram aquelas escapadinhas que mostraram lojas saqueadas pela polícia, inclusive com roubo de dinheiro. Houve ainda notícias sobre casas saqueadas. Isso a televisão chamou de abuso de autoridade. Eu chamo de banditismo.

Vítimas, de quem?
E a matança? Bom a matança é o que alimenta a guerra no Rio. Vocês que lêm o meu Blog fora do país, saibam que nas favelas cariocas o maior número de mortes não é provocado pela briga do tráfico, mas pela ação da polícia. E é isso que alimenta o tráfico, porque cria uma aversão, da parte da comunidade, ao trabalho da polícia. A mídia que tem se esforçando apresentando bilhetes mirabolantes com mensagens de apoio à polícia, cuja origem é bastante duvidosa, só contabilizou os mortos no segundo dia da "guerra", naquela ocasião, a PM teria matado 35 pessoas e a Polícia Cívil 9, ou seja, 44 pessoas haviam sido mortas. Daí pra frente falou-se sempre em mais de 30 mortos. Bom, há que se imaginar que esse número de 44 tenha subido bastante, assim, mais de 30 mortos é sempre um eufemismo para florear a verdade.

E quem morreu? Quem foi preso? Quem morreu sabemos de alguns: uma adolescente que morreu enquanto usava o seu computador, uma senhora doente, um velhinho e outros mais cujos detalhes foram poupados aos ouvidos e olhos da grande massa. E os traficantes? Dois, reconhecidos, foram presos. Ao que parece os outros fugiram. Estranho. Tudo cercado, uma mega operação, a verdadeira guerra... Estranho mesmo. Estranho uma guerra sem combatentes. Os traficantes, a imprensa reconhece, fugiram. Então, entre quem se travou a guerra? Aí encontramos as vítimas, pessoas comuns, porque os traficantes mesmos figiram e qualquer bom entendedor do Rio e da polícia que tem lá pode imaginar sob que condições se deram estas fugas.

Enfim, o sucesso da operação está ameaçado, a longo prazo, porque o objeto da guerra, por mais que a imprensa esconda, foi a própria população que sofreu duras baixas. O sucesso da operação é comprometido porque a polícia do Rio de Janeiro, como bem diz o diretor de "Tropa de Elite", pela boca do capitão nascimento, deveria ser estinta, ou, no mínimo, creio eu, recomeçada do zero.