PÁGINAS

sábado, 4 de outubro de 2008

Fundamentos da prática docente no enfoque das tendências pedagógicas

Moisés Pereira da Silva[1]
"O importante da educação não é apenas formar um mercado de trabalho, mas formar uma nação, com gente capaz de pensar."
José Arthur Giannotti


Muitos professores abordaram, com textos e outros recursos, temas ligados às teorias norteadoras da prática docente. As bases teóricas da prática docente emanam, de certa forma, da mesma fonte de onde provêem as bases legais. É evidente, porém que existe vasta literatura dando conta do perfil ideal do professor, da relação entre sua teoria e sua prática e, que em função disso, servem como norteadores da prática educativa.

Justificar a afirmativa acima é necessária. A LDB quando em seu artigo 62 afirma ser obrigatória a formação em nível superior para o exercício do magistério termina por delinear a que tipo de teoria o professor delineará o seu trabalho. Então, temos que admitir que não se trata mais de formulações do senso comum. Trata-se, antes de tudo, de uma prática que deverá ser respaldada por teorias cientificamente aceitas como possibilidades de aplicação qualitativa para a educação.

Usar a experiência dos mais velhos como base teórica para o seu trabalho não era uma constante apenas dos trabalhos manuais, também entre os professores era muito comum, segundo alguns autores, “tomarem como fonte de orientação para seu fazer cotidiano conselhos ou prescrições de professores mais experientes” (PAGOTTO, 1988; MARIN, 1990; LIBÂNEO, 1984, entre outros). Entretanto, quase sempre, estes estudos criticavam este procedimento dos professores, seja pelo caráter a - teórico que evidenciavam, seja pelo desprestígio à formação básica dos professores daí decorrente.

Hoje com essa determinação da Lei disponibilizou-se, até com discutível qualidade, uma grande quantidade de cursos de licenciatura। Esse é um ponto de partida para uma base teórica pedagógica elaborada com elementos acadêmicos e não com achismos. Considerando o caso específico dos docentes formandos da UEG, Unidade de Niquelândia, foi apresentado um vasto conjunto de teorias e metodologias visando o horizonte da prática pedagógica. A classificação de José Carlos Libâneo possibilitou uma distinção das tendências pedagógicas e o estudo de cada segmento ofereceu elementos teóricos para a prática educativa fundamentada.

A sociedade tem sua coesão e sua síntese em suas manifestações culturais. Como a cultura se caracteriza pelos valores e costumes de um povo é a soma desses elementos comuns que qualifica o grupo como sociedade. Seguindo essa linha de pensamento e analisando as características da sociedade brasileira desde o período da invasão portuguesa se perceberá que o modelo social baseado nos valores comunitários foram rapidamente substituídos pelos valores de uma classe dominante e a desigualdade, com mando da elite, tornou-se a principal característica sócio-histórica do Brasil.

A educação, como reprodutora da sociedade, seguiu esse mesmo caminho. De um modo geral a história da educação no Brasil apresentou um modelo de ensino sem pretensão de mudança. A educação, ainda como hoje, era um elemento de classe, da classe dominante. Então buscando uma memória da trajetória do ensino brasileiro, seja ao nível de Brasil, seja o caso específico de Goiás, se perceberá o modelo pouco cientifico, mas fortemente humano e valorizador das experiências e dos valores sócio-afetivos dos povos nativos foram substituídos pelo modelo português que se baseava no sistema jesuítico de ensino.

Esse foi um momento de rompimento, como foi rompimento as mudanças de pombal que expulsaram os jesuítas. Aulas régias baseadas num sistema simples que pretendia letrar alguns. Essas escolas funcionavam tendo um único professor que atendia cada aluno de forma individualizada. Era muito comum a família ter um professor específico para sues filhos. A concepção do ato de educar estava muito ligada à idéia de instrução e mesmo depois da independência e da proclamação de uma educação, com princípios iluministas a escola estava longe de ser um veículo de mudança da ordem social vigente.

No século XIX, além da fundação de escolas normais, foram enviados à Europa, professores para se instruírem nos “modernos” métodos de ensino então vigentes. Foram, também, adotados manuais didáticos que norteariam o ensino a ser estabelecido, entre eles o curso normal para professores de primeiras letras relativas á educação física, moral e intelectual, escrito pelo francês Joseph-Marie de Gérando, traduzido e impresso no Brasil em 1839, voltado para a educação das camadas pobres.

Fundado no método mútuo, este foi o primeiro manual didático-pedagógico adotado no Brasil. As mudanças na educação se davam tanto no aspecto técnico-político quanto em relação às concepções pedagógicas; neste último caso com uma crescente crítica ao método mútuo. O método mútuo ou monitorial, difundido em vários países da Europa no início do século XIX, foi também introduzido no Brasil, com a proposta de ensinar o maior número de alunos da forma mais rápida e econômica possível. Nos discursos acerca da educabilidade da infância, presente tanto nos impressos pedagógicos como na legislação, encontra-se presente a preocupação com a viabilização do ensino das crianças pobres. A legislação assegurava parte da despesa provincial destinada à instrução pública, para a aquisição de objetos necessários ao ensino dessas crianças.

Em Goiás, desde os primeiros anos de colonização, com a fundação de algumas escolas na região da Cidade de Goiás e depois o colégio Lyceu de Goiás. O Lyceu não é referencial de método, mas foi o segundo estabelecimento de ensino secundário do Brasil. Para o Estado de Goiás merece atenção pelo seu histórico como espaço de formativo de muitas lideranças políticas do Estado. A verdade, contudo, é que Goiás seguiu o mesmo ritmo da formação do restante do Brasil; uma formação pauta nos vícios camadas mais ricas. A preocupação era mais instruir que realmente educar.

Os parâmetros curriculares delineiam a concepção de uma nova educação, de um novo educador, de um novo educando e de uma nova escola. A escola tradicional, pautada na crença em que o conhecimento é algo pronto, acabado, perfeito, no qual o capital cultural pertence apenas aos que detém inteligência e competência, em que o aluno é visto como uma tabula rasa, uma folha de papel em branco, e que traz a preocupação excessiva como treino de habilidades, com a memorização, com a repetição e a imitação, e a imitação, está inadequada para a atual realidade e é como alternativa à essa visão que os parâmetros sinalizam uma nova visão da escola, uma escola mais democrática, inovadora, mais comunitária.

Pensar a escola com essas qualidades requer uma reflexão sobre a formação daqueles que nela atuam. Neste final de milênio a discussão a cerca da formação do professor ganha maior vigor com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a LDB nº 9.394/96, que requer até o final da primeira década que os professores tenham formação superior em sua área. Essa lei cria uma nova modalidade de curso normal superior que, nos Institutos Superiores de Educação, encarregar-se-iam da formação do profissional docente.

No caso dos alunos-professores do curso de pedagogia, que é o caso específico do curso objeto desse relatório, a formação está voltada para a qualificação de e especialização de profissionais da educação infantil. A pedagogia tem afinidades com ciências da educação e limita-se ao aprofundamento de estudos da área docente.

A despeito de qualquer polêmica é significativo o avanço na educação a partir dessa preocupação com a formação docente. Sabe-se, todavia, que no caso específico do curso de pedagogia e sendo essa voltada para as séries iniciais, é sempre preciso considerar que as disciplinas das séries iniciais não requerem apenas didática, requerem do professor conhecimentos de áreas afins e o curso de pedagogia fica muito a desejar quanto a isso. Não se pode ignorar que um aluno de 3ª série, ou 4ª série precisa ter noções de matemática, geografia, ciências, história, português, etc. é, portanto, necessário que toda formação que tenha em vista a docência confira conhecimentos específicos, mesmo que minimamente, aos seus formandos.

A educação tem sido tratada a muito tempo como objeto de discursos vazios feitos em palanques ou em rede nacional, via satélite, a eleitores bestificados que tudo ouvem, pouco sabem e nada querem. Considera-se, nesses discursos, a importância da educação como instrumento de desenvolvimento sócio-econômico e a partir desse reconhecimento criam-se leis e decretos. Mas pouca coisa muda.

O professor pouco valorizado financeiramente está submetido a preceitos legais e regras condicionantes de cada sistema a que esteja integrado. Considera-se também, no que diz respeito a seu perfil, a importância do seu papel social posto que seu fazer é predominantemente político e que, dado esse fato, ele precisará sempre que escolher entre oprimidos e opressores. Dentro dessa situação de escolha o professor ainda terá que delinear sua postura a partir das disposições legais inerentes ao exercício da sua função. A esse respeito a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 9.394/96 preconiza que:

A formação de profissionais da educação, de modo a atender aos objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características de cada fase do desenvolvimento do educando, terá como fundamentos a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação em serviço; aproveitamento da formação e experiências anteriores em instituições de ensino e outras atividades. (LDBEN, 1996, Art। 61).

Sem dúvida o elemento mais importante nesse artigo é a imposição da “associação entre teoria e prática”. Fica claro então que o aprender tem que ter cor, cheiro, som e materialidade. Anterior a esse artigo, o artigo terceiro, entre outros valores, defendia:

“O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas; respeito à liberdade e apreço à tolerância; valorização do profissional da educação escolar”. (LDBEN, 1996, Art. 3).

Se Fixa aí a crença no poder transformador da educação dentro da lei e abrem-se as janelas da esperança para um novo educar dentro da sala de aula. É preciso confiar nessas mudanças e esperar o inesperado, pois como nos diz Edgar Morin (2002, p. 92): “Na história, vimos, com alguma freqüência, que o inesperado torna-se possível e se realiza; vimos com freqüência que o improvável se realiza mais do que o provável”. O Brasil tem mais de 2,6 milhões de professores na educação básica e superior, responsáveis pela educação de 57,7 milhões de brasileiros. Cerca de 80% dos docentes de ensino infantil, fundamental e médio atuam em escolas públicas e 15% do total estão em escolas rurais. São muitas vozes em contatos com outras vozes e mentes é impossível não conceber daí o fio da esperança, o fumegar de uma esperança. Não há nada mais apregoado, tanto na legislação quanto nas teorias pedagógicas, quanto a necessidade de uma mudança nas bases da sociedade brasileira. Transformador, portanto, deve ser o perfil do professor.

As tendências pedagógicas têm grande importância dentro do curso de pedagogia. Elas encaram as bases teórico-metodológicas da prática docente e como tal devem ser conhecidas. No campo da educação brasileira pode-se classificar as tendências pedagógicas em dois grupos: as de caráter liberal - pedagogia tradicional, pedagogia renovada e tecnicismo educacional e as de caráter progressista - pedagogia libertadora e pedagogia crítico social dos conteúdos. Muitas vezes encontram-se ainda outras formas que misturam elementos de duas ou mais destas tendências.

No aspecto teórico-prático, ou seja, nas manifestações na prática escolar das diversas tendências educacionais será sempre necessário considerar que cabe ao professor discernir em que modelo sua prática se pautará, qual tendência melhor corresponde à sua realidade. O mais importante na prática educativa não é conhecer, conhecer e ter coerência para aplicar o que se sabe.

Considerando a divisão de Libâneo, de tendências liberais e progressistas, a tendência liberal é justificadora dos sistemas capitalistas que buscam defender a predominância da liberdade e dos interesses individuais na sociedade. Nas pedagogias liberais a função da escola é a de preparar os indivíduos para atuarem na sociedade, segundo suas aptidões, adequando-os às normas vigentes. As tendências progressistas, por outro lado, trazem como ponto forte a dimensão político-social.
A pedagogia progressista libertadora de Paulo Freire concebe a construção do conhecimento como sendo realizada pelo diálogo entre educadores-educandos, mediada pela realidade concreta em que vivem. Assim, os conteúdos são extraídos e apreendidos dessa realidade, estudados e novamente retornam a ela, no sentido de transformá-la.

A tendência liberal constitui-se das seguintes teorias pedagogia liberal tradicional, justificadora do sistema capitalista de produção; pedagogia liberal renovada progressivista, que busca trazer a vida externa para o interior da escola, preocupada com a aprendizagem ativa do educando; pedagogia liberal renovada não-diretiva, que tem preocupação com problemas psicológicos e com o estabelecimento de um clima de mudança interna do indivíduo e tendência liberal tecnicista que é voltada para a cientificidade e a competência, as técnicas e métodos que aumentam a eficiência da aprendizagem tornam-se centrais.

Era ir ao encontro desse povo emerso nos centros urbanos e emergindo já nos rurais e ajudá-lo a inserir-se no processo, criticamente. E esta passagem, absolutamente indispensável à humanização do homem brasileiro, não poderia ser feita nem pelo engodo, nem pelo medo, nem pela força. Mas, por uma educação que, por ser educação, haveria de ser corajosa, propondo ao povo a reflexão sobre si mesmo, sobre seu tempo, sobre suas responsabilidades, sobre seu papel no novo clima cultural da época de transição. Uma educação que lhe propiciasse a reflexão sobre seu próprio poder de refletir e que tivesse sua instrumentalidade, por isso mesmo no desenvolvimento desse poder, na explicitação de suas potencialidades, de que decorreria sua capacidade de opção. (FREIRE, 1996, p।66-67).

Como pode ser percebido nas palavras de Paulo Freire, na citação acima, a tendência progressista é composta de teorias que visam o desenvolvimento dos aspectos humanos e da sua emancipação. Nessa tendência despontam as teorias progressistas libertadoras que têm como grande nome Paulo Freire que com seu método defendia o processo dialógico e a problematização do ensino-aprendizagem; complementar a essa teoria, a pedagogia progressista libertária acentua a conotação política do movimento anterior e a pedagogia progressista crítico-social dos conteúdos, defendida por Libâneo inclui a valorização dos conteúdos do saber sistematizado, mas não numa perspectiva estática como na educação tradicional, ao contrário, pensam conteúdos a partir da problematização de situações concretas, conteúdos vivos e inseridos no contexto sócio-político do aluno.

Em fundamentos a educação é rica em perspectivas. Mas fica sempre o alerta prenunciado anteriormente. É preciso conhecimento aliado à coerência e ao compromisso social do professor para que qualquer teoria pedagógica ganhe vida prática a partir de seu agir.

LETTIERI (1980) diz que “o capitalismo de hoje não recusa o direito à escola. O que ele recusa é mudar a função social da escola”. Não são poucos os educadores que tratam da função social como algo avesso aos interesses predominantes do sistema capitalista. É preciso uma reflexão sobre a escola que temos e a escola que queremos e os conceitos sobre uma escola alienada e uma escola cidadã. É preciso ultrapassar a pedagogia da denúncia e da constatação para uma práxis que proclame como finalidade a garantia efetiva dos direitos dos cidadãos presentes na Constituição e no Estatuto da Criança e do Adolescente. É fato notório que a escola pública precisa redimensionar seu projeto político e pedagógico para que se torne uma escola cidadã. Segundo GADOTTI:

São necessárias algumas diretrizes básicas, dentre as quais estão: a autonomia da escola, incluindo uma gestão democrática, a valorização dos profissionais de educação e de suas iniciativas pessoais. Oportunizar uma escola de tempo integral para os alunos, bem equipada, capaz de lhe cultivar a curiosidade e a paixão pelos estudos, a valorização de sua cultura, propondo-lhes a espontaneidade e o inconformismo. (1995, p। 96).

Essas características bastariam para elevar o status da escola ao nível de escola cidadã. Uma escola cidadã viabilizaria a produção de projetos individuais, a partilha de projetos coletivos e promoveria a articulação entre ambos, um fator importante para a realização de ações e sonhos imbuídos de um significado político e social mais amplo.

Repensar o papel da escola significa pensar o papel do professor e, conseqüentemente, significa também repensar o processo de ensino aprendizagem, suas metodologias, os fins incutidos nos métodos avaliativos e a matemática dos dados da escola resultante da prática docente. Educadores e educadoras precisam engajar-se socialmente. A escola não pode ser mais um laboratório de exclusão. O processo de ensino-aprendizagem precisa ser um processo amplo com a qualidade de preparar o aluno tecnicamente para o trabalho e moralmente para a vida e vida com dignidade.

Existe um jogo de palavras usado por Paulo Freire para falar das relações homem-mundo e nessa reflexão ele termina por traçar também as perspectivas da relação sociedade e cultura. O mais significante nessa abordagem é o alerta sobre a tendência comum da sociedade neoliberal em coisificar o homem o tornando objeto no mundo e apenas vítima incolor da sua cultura. Essa é uma abordagem com considerações antropológicas do ser do homem e, ao mesmo tempo, com aspectos sociológicos porque também pensa as formas de existir do homem no mundo.

Na afirmação acima está a base para entender teoria e prática na ação pedagógica, pois a relação teoria e prática se dão primeiro e antes de tudo na relação homem-mundo. Esta relação busca coerência entre pensamento e ação que é práxis. Do contrário, como diz Freire, a ação sem pensamento é ativismo, e o pensamento sem ação é verbalismo.

Ao enfatizar o caráter contemplativo da teoria Paulo Freire garante a inserção do homem na realidade. A relação entre teoria e prática centra-se na articulação dialética entre ambas, o que não significa necessariamente uma identidade entre elas. Significa assim, uma relação que se dá na contradição, ou seja, expressa um movimento de interdependência em que uma não existe sem a outra.

No jogo dessas relações do homem com o mundo e do homem com os homens, desafiando e respondendo ao desafio, alterando, criando, que não permite a imobilidade, a não ser em termos de relativa preponderância, nem das sociedades nem das culturas. E, na medida em que cria, recria e decide, vão se conformando as épocas históricas. É também criando e decidindo que o homem deve participar destas épocas. (FREIRE, 1983, p। 75).

Percebe-se que é enfática a abordagem de Paulo Freire no propósito de expor a dinâmica necessária às relações do homem com a realidade. De fato, Jean Paul-Sartre em O Ser e o Nada diz que foi a consciência das possibilidades de uma vida melhor que engajou os camponeses da França na Revolução Francesa e, no mesmo livro, afirma “o homem está por sua consciência, sempre além de si mesmo”. A liberdade é, por conseqüência, condição básica para o agir do homem no mundo e o seu fazer cultural. A esse respeito Sartre afirma que estamos "condenados à liberdade"; e, segundo ele não há limite para nossa liberdade, exceto o de que "não somos livres para deixarmos de sermos livres”.

De uma escola que, continuando a ser um tempo-espaço de produção de conhecimento em que se ensina e em que se aprende, compreende, contudo, ensinar e aprender de forma diferente. Em que ensinar já não pode ser este esforço de transmissão do chamado saber acumulado, que faz uma geração á outra, e aprender não é a pura recepção do objeto ou do conteúdo transferido. Pelo contrário, girando em torno da compreensão do mundo, dos objetos, da criação, da boniteza, da exatidão científica, do senso comum. Ensinar e aprender giram também em torno da produção daquela compreensão, tão social quanto a produção da linguagem, que é também conhecimento। (FREIRE, 1997, p. 5).

As relações do professor dentro da escola e fora dela é complexa em função de paradigmas estabelecidos nos princípios da educação brasileira. Tinha-se a idéia de um professor, na verdade professora, que se identificava com papéis próprios de ente da família do aluno, cumpria e cumpre ao professor dar o exemplo moral. O problema é que a moral defendida e pretendida para o professor esconde a ideologia da inércia. Pretende-se com o moralismo imposto ao professor impedir, por exemplo, que ele participe de movimentos grevistas, para não ser visto como um desordeiro. O que se pretende do professor é que ele seja manso.

Decorrente dessa “moral” o professor deve zelar pelo seu comportamento e, inclusive, não manifestar certos “afetos” por suas alunas. Imídeo Nérci em sua obra Didática, uma introdução apresenta o professor como obrigado ao exemplo moral, inclusive criticando os casos de namoro entre professor e aluna ou professora e aluno. No caso específico da abordagem desse autor ficou vago a identificação necessária do professor como aquele que deve dar o exemplo social.

Da postura do professor depende a postura da escola em relação à sociedade. Não cabe mais aquele modelo de professora tia, ou daquela professora normalista. O professor é antes de tudo profissional e suas relações de trabalho têm que se dá no nível profissional. A escola deve ser o espaço da mudança, mas não o será comportando em seu interior professores bonzinhos.

O professor bonzinho é tio e tia, o professor profissional luta por seus direitos e por justiça social. Não se empreende nenhuma luta com puxasaquismo, licenciosidade ou com amansamento. Luta se faz por imposição de argumentos e imposição de direitos. O professor não pode ser baderneiro, nem imoral. Mas sua relação com o aluno deve acontecer pelo exemplo. O aluno não pode respeitar o professor só pela imposição do argumento autoritário deste, o respeito deve advir sobremaneira da admiração, da amizade e da harmonia entre ambos. Esse é o modelo do bom professor, esse professor faz a boa escola para a sociedade mais justa, menos faminta e mais escolarizada.

O processo de ensino-aprendizagem requer didática e recursos metodológicos em vista ao fim pretendido pela educação. Esses fins se mostram na avaliação que se faz do processo pedagógico. A avaliação, por sua vez, requer um repensar sobre o papel do professor e do aluno, sobre a atuação de cada um, sobre a relação entre ambos. Quem vai se relacionar com alguém deve primeiro, mostrar que está disposto a aprender. A solicitação de feedback ajuda bastante nesse processo. O que facilita então a criação do clima é passar para o outro que estamos dispostos a nos orientar pelas suas expectativas, necessidades. A avaliação, nessa perspectiva é um processo de reflexão e auto-reflexão. Professor ao avaliar, também avalia a si mesmo.

A experiência educacional é a mais humana de todas as experiências, aquela que nos permite recriar continuamente a história e apropriamo-nos dos bens da cultura. É através do pensar, do aprender, do criar que estamos nos adiantando sempre e buscando organizar os espaços em que vivemos. Esse ensinar não é uma aventura qualquer, mas o início de uma relação e de uma história de vida dos sujeitos que participam da aventura maior que é adentrar aos grandes mistérios do conhecimento humano por uma trajetória nova, que segundo coelho (1999), "não se constitui de forma linear, num contínuo acrescentar de mais tijolos nessa interminável construção, mas se faz também de rupturas, de descontinuidades".

Portanto, será a avaliação um processo de reconhecimento das habilidades auferidas pelo ato educativo, habilidades tais como a competência intuitiva, competência intelectiva, competência prática e competência emocional, entre outras. A avaliação escolar não deve ser empregada quando não se tem interesse em aperfeiçoar o ensino e, conseqüentemente, quando não se definiu o sentido que será dado aos resultados da avaliação. Ela não pode ter fins meramente de termômetro do conhecimento; tem que servir de base para a prática da escola tendo sempre em vista a melhoria da qualidade do ensino.


Bibliografia

FREIRE, Paulo. Professora sim, tia não – cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Editora Olho d´Água, 1997.
____________ Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
_________________Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.
GADOTTI, Moacir। Histór ias das Idéias Pedagógicas. São Paulo: Editora Ática, 1995.
LETTIERI, Antonio. “A fabrica e a escola”. In André Gorz, Critica da divisão do trabalho, São Paulo, Martins Fortes, 1980.
LIBÂNEO, José Carlos. A prática pedagógica de professores de escolas pública. São Paulo: PUC/São Paulo, 1984.
LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996.
MARIN, A.J. Trabalho docente: perspectivas, modelos e anotações sobre o tema. São Paulo: Faculdade de Ciências e Letras/Unesp, 1990.
MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à Educação do Futuro. São Paulo/Brasília. Editora Cortez/UNESCO. 2002.
_______________. Trabalho docente: perspectivas, modelos e anotações sobre o tema. São Paulo: Faculdade de Ciências e Letras/Unesp, 1990.
PAGOTTO, M.D.S. Formação e atuação: Um estudo sobre representações de professores. São Carlos-SP: UFSCar, 1988.
[1] Professor de História, licenciado em História, pedagogia e graduado em Filosofia.

Um comentário:

  1. Texto alertador da consciência e do senso crítico.
    Gostei e utilizei, com referência, é claro!

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