Conheci o Manelão em 1996. Pessoa simples, mas que sempre, de forma muito forte, marcava todos que o conheciam. Enquanto estive no seminário em Conceição do Araguaia, e depois já em Belém, quando ia à Conceição, sempre o visitava. Conheci os seus filhos, inclusive de beleza excepcional, a Clara. Me parecia um bom pai. Para as pessoas das comunidades que freqüentava, Manelão tornava mais significativo o sentido de grande família de Deus, princípio dos irmãos que, na simplicidade, se reuniam para rezar.
Tardiamente, somente dia 30 de março passado, fiquei sabendo, por acaso, da morte de Manelão. Estou muito isolado daqueles cuja amizade é valiosa. Estou distante de muitas pessoas boas. Li depois, num texto dos dominicanos:
"Vítima de infarto faleceu no início da tarde deste sábado, 10 de dezembro, Manuel Martins de Almeida, o Manelão, em Conceição do Araguaia no Pará, em sua pequena chácara às margens do Rio Araguaia, tratada por ele como “Santuário Ecológico”. Casado com Marlene tinha um filho e duas filhas e sete 07 netos.
Manelão, ao contrário do que o nome sugere não é uma pessoa alta. Por opção desde a juventude andou descalço e carregava consigo a bíblia, o violão e o cajado.
Manelão das Comunidades Eclesiais de Base, poeta, compositor e cantador das belezas da natureza e da religião popular. Manelão sempre foi apaixonado pelo Povo do Araguaia e pelo Rio Araguaia. Na busca de fidelidade ao Deus dos Pobres inspirava-se em Jesus Cristo e São Francisco de Assis. É o símbolo encarnado da simplicidade. Ele tinha um profundo amor pela Família Dominicana e se sentia leigo dominicano.
Manelão participou, no último final de semana, em Xinguara do Encontro de lavradores das áreas de conflitos da região Sul do Pará, contribuindo muito – de acordo com Aninha – com a espiritualidade da caminhada. Nesse mesmo Encontro ao receber a Agenda Latina Americana de presente, beijou-a e disse: “eu estava precisando desse Encontro e dessa Agenda para reforçar a minha opção”.
Lá do céu, Manelão continua cantando: “É madrugada, levanta povo / a luz do dia vai nascer de novo / Rompe as cadeias, abre o coração / Vamos dar as mãos / já é Reino do Povo".
E aí fiquei com a sensação de que ele se foi e eu, se pudesse ter a consciência do quanto a vida é breve, breve até para pessoas assim tão marcantes, deveria ter passado por sua casa mais uma vez, conversado com ele mais uma vez, ouvido seu violão mais uma vez, ouvido histórias do Araguaia e de Conceição mais uma vez. A morte é mesmo ingrata, leva pra si o que deveria deixar entre nós. Manelão, eu sei que, finalmente, encontraste a liberdade. Contigo aprendemos, todos nós, que pés descalço significa muito.