Essa é a primeira vez que escrevo diretamente para alunos meus. Acho que isso é importante, que os alunos se iniciem no contexto de uma relação dialógica-digital, e sou, enquanto professor, um dos responsáveis por essa iniciação, sobretudo porque sei que muitos dos que usam a internet ainda a utilizam com perspectivas limitadas, pelo menos no que diz respeito ao processo educacional. Pois bem, feita essa justificativa, adentremos o nosso tema, a democracia.
Estou convencido que a democracia é um tema complexo. Quando se pensa no conceito até parece fácil, e alguns dos que estão lendo esse texto devem pensar na idéia do povo governando através de representantes políticos. Pois bem, tem muito a ver com isso, mas é preciso pensar a democracia lá no seu nascedouro, na sociedade ateniense.
A Grécia Antiga, como já comentei em sala de aula, era composta de várias cidades independentes entre si, por isso eram chamadas de cidades-estados. As mais importantes, entre essas cidades, foram Atenas e Esparta. Foi em Atenas que um grupo de sábios, os filósofos, se ocuparam em pensar sobre a beleza, a justiça, as virtudes, etc. Esses homens não ocupavam o seu tempo com reflexões e estudos desligados da realidade, como parece para alguns, pelo contrário, estudavam porque queriam entender o mundo em que viviam, e queriam torná-lo melhor.
Foi essa busca por melhores formas de convivência que resultou na formulação da democracia em Atenas. Antes, porém, essa Cidade-Estado viveu uma experiência de ser governada por regime tirânico, no século IV a.C. Esse regime teve fim com a morte, em 514 a. C. de Hiparco, o último tirano. Com a queda da tirania, o poder político em Atenas passou a ser disputado por dois grupos políticos: o dos ricos donos de terras, chefiados por Iságoras, e o dos populares, liderado por Clístenes. Iságoras, apoiado pelo rei espartano Cleômenes, conseguiu desterrar Clístenes. Mas o povo se revoltou e conseguiu trazer o líder de volta, dando-lhe plenos poderes para elaborar uma nova constituição.
Com poderes delegados pelo povo como nomotheta, Clístenes implementou uma profunda reforma política que tinha como objetivo deslocar o poder das mãos dos nobres para as dos demos, palavra que significava não apenas povo, como também os bairros e comunidades habitados. A democracia, portanto, foi uma sistema político a partir do qual todos os cidadãos atenienses podiam tomar parte nas decisões sobre o futuro da cidade.
No entanto, a primeira consideração importante é sobre quem eram esses cidadãos. Basicamente a sociedade ateniense era composta por três grupos sociais: cidadãos, metecos e escravos. Os cidadãos eram ricos proprietários de terra. Os metecos eram estrangeiros que moravam em Atenas, eles estavam proibidos de possuir terras e não tinham direitos políticos. Os escravos eram propriedades de seus senhores, que por sua vez, deviam cuidar do bem, o escravo, sem causar-lhe sérios danos. Assim, caro aluno, nota-se logo de cara, que a cidadania em Atenas era restrita aos cidadãos e que ser cidadão significava ser homem e possuir terra que, desde as primeiras comunidades, como já estudamos, era o maior bem que se podia ter.
Uma das aprendizagens dos jovens filhos de família rica em Atenas era oratória. O jovem rico era instruído a falar bem. Ele devia saber seduzir os ouvidos do povo. Falar a verdade não era necessário, o mais importante era convencer pelo argumento. O pobre, não tinha acesso a estudo. Estudo em Atenas, a filosofia, bem como a cidadania, eram coisas de quem era livre. Ser livre em Atenas, no entanto, era não estar preso ao trabalho manual, que era considerado coisa de escravo ou de gente inferior, os metecos.
Outro problema da democracia é o apontado por Aristóteles. Muitos estudiosos se dedicaram ao estudo da política ateniense. Entre esses estudiosos quero destacar o pensamento de Aristóteles. Para esse grande pensador, a democracia popular é merecedora de desconfiança porque nela as massas são soberanas, mas essa soberania é exercida por um agente demagógico, que se torna manipulador das massas. O seu caráter demagógico, adulador, mentiroso e enganador seduz o povo, que lhe outorga o poder.
No caso da democracia no Brasil, penso que se torna necessário muitas reflexões. Primeiro, aqui temos o político profissional. Esse realmente é um grande demagogo, demagogo, significa dizer que ele, o político demagogo, usa um discurso que alcança o emocional das pessoas, as envolve, mas que na verdade é vazio, porque não parte das convicções do político, mas do propósito de enganar o povo. Segundo, o povo vende o poder, e vende barato. O poder é popular, mas, por dez, quinze, vinte, cinqüenta ou cem reais a pessoa, na fila do voto, o vende para qualquer criminoso que, depois de comprar esse poder, passa a exercê-lo agindo mal contra o povo.
Em Atenas estavam excluídos da vida política os estrangeiros, os escravos, as mulheres e as crianças; no Brasil, estão excluídos todos que, por ignorância política, abrem mão desse direito por um botijão de gás, alguns litros de gasolina, dinheiro ou outro favorecimento qualquer.
Enquanto nossa sociedade comportar-se assim, a democracia aqui jamais será plena. Mas, a bem da verdade, a história mostra que ela, a democracia, jamais foi plena e, penso eu, jamais será porque toda utopia tem assim, esse caráter, de ser irrealizável.