Resumo: A presente proposição constitui-se de uma análise de como a realidade da fronteira –sobretudo no que diz respeito ao seu sentido de espaço da representação do outro –se manifesta em nossa realidade, e dentro dessa realidade –na relação entre mundo urbano e mundo rural. Nessa perspectiva, “um sertão chamado Brasil” de Nísia Trindade e “Fronteira: degradação do outro nos confins do humano” constituem pano de fundo para essa abordagem. Soma-se a estas contribuições o trabalho de Paulo Bertran, pela introdução que faz co conceito de eco-história.
Palavras-chave: fronteira, urbano, rural, eco-história.
Por uma questão metodológica prefiro iniciar pelo que poderia ser conclusivo, ou seja, diante do homem da fronteira que representa e que é representado numa contínua tentativa de centralização, apresentar a diversidade brasileira que, para Bertran, levando em conta em suas palavras, “nossa ecologia mínima” é constituinte do múltiplo, do complexo e do diversificado. Isso posto, levando em consideração o caso específico do homem do sertão brasileiro, há uma clara tendência de determinação do mesmo feito pelo homem urbano como se fosse uma regra a centralidade do urbano como representante dos valores civilizatórios de que padece o sertanejo. Assim, a introdução de Bertran já antecipa –embora prematuramente –a visão descentralizadora necessária à valorização do diverso.
Adentrar no íntimo dessa questão por ter um caminho facilitado a partir do apoio teórico fornecido pelas obras de Nísia Trindade, “um sertão chamado Brasil” e José de Souza Martins, “Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano”. A nossa primeira ocupação será da relação que há entre o trabalho de Nísia Trindade e a nossa proposição. Assim, na primeira parte da obra de Nísia Trindade ela dá conta que o tratamento intelectual dessa questão consiste no estabelecimento de uma noção de fronteira: o moderno x refratário. O litoral como área de modernidade e progresso e o sertão como resistência à força renovadora desse progresso.
Nesse primeiro momento a historiadora é muito bem sucedida na sua análise das relações sertão-litoral ao apresentar a noção de civilização e barbaria, o que evoca um campo de perspectiva mais amplo. O sertão, na sua resistência ao progresso incorpora uma noção ocidental de barbárie, enquanto o litoral mais aberto à modernidade –e pós-modernidade para citar Stuart Hall, representa o civilizado. Norbert Elias auxilia esse entendimento ao afirmar que civilização corresponde a uma auto-concepção que o Ocidente tem de si mesmo, sendo, portanto, essa uma diferenciação em relação aos povos subalternos –não civilizados. Esses argumentos põem o debate no plano da identidade e nesse sentido novamente retomamos o trabalho de Stuart Hall para quem a identidade na pós-modernidade é descentrada, múltipla e em transição. Assim, os intelectuais da elite percebem-se a si mesmo –e aqueles que representam –como ligados ao sentido universalista da modernidade; os outros –oprimidos e fracos –são matéria para as elaborações intelectuais como coisas que precisam ser interpretados –e se possível adequados.
Nísia aborda aquilo que chama de “representação geográfica da identidade nacional” (p.35). O que a Inglaterra foi para a Europa moderna, Os Estados Unidos da América se tornou para os povos latinos, a saber: uma referência de progresso e civilidade. Nessa relação a estudiosa recorre a Weber e Tocqueville para demonstrar como a sociedade norte americana era vista de forma positiva em oposição à barbárie dos povos latinos. A transposição dessa bipolaridade para o contexto brasileiro revela um conflito que envolve identidades e representações. O homem moderno –que antes de tudo integra a elite do país sempre no poder, mas especialmente no poder com a República –opõe-se ao não moderno que, essencialmente corresponde àqueles destituídos do poder e, geograficamente, afastados dos centros do poder, ou residente dos sertões.
Experiência e prejulgamentos correspondem a duas possibilidades de conhecimento corrente sobre o sertão. O próprio sentido etimológico –de sertão como deserto social e interior espacial –compreendem o ideário elaborado sobre o sertão, ideário esse que é base para pré-julgamentos em que o sertão figura como a antítese da ordem. Um outro dado comum a essa ideologia é a de sertão como área despovoada, como o semi-árido nordestino, o que, em verdade, configura fundamentalmente, a distância em relação ao poder. O sertão, portanto é o pólo que opõe o moderno ao atraso; estando, de outro lado, o litoral como o espaço da civilização onde, sobretudo, na leitura de Euclides da Cunha, prevalece a inautenticidade típica de uma sociedade moderna, aberta e receptiva ao novo e ao diferente. Em síntese apresentada por Nina Rodrigues, o litoral é o “reduto da civilização e dos grupos brancos” enquanto o sertão é o espaço “dominado por uma população mestiça, infantil, inculta, em estágio inferior da evolução social” (p. 60). Outra visão é a pintada pelos românticos e naturalistas, o que, resultado de relatos de viagens, Nísia chama de franksteiniano”. Nessa perspectiva, o índio é símbolo da nacionalidade e o sertanejo é um ser viturtuoso, de modo especial na literatura romântica.
O período republicano é de integração do sertão à nacionalidade e dentro dessa concepção integracionalista e de valorização promovem-se expedições desbravadoras como as de Cândido Rondon, Louis Cruls e do Instituto Oswaldo Cruz. Nessa proposta de integração do sertão José Bonifácio na Constituinte de 1823 propôs a construção de uma nova capital na região central do Brasil, ou seja, se propunha a interiorização da própria esfera do poder. O entendimento, porém, dessa concepção integracionista é bem apresentada por Nísia Trindade que diz:
O desbravamento do sertão pode ser visto como um movimento de forte conteúdo simbólico, que acompanhou os projetos oficiais de delimitação de fronteiras, saneamento, utilização de recursos naturais, povoamento e integração econômica. (p. 67).
A viagem de Euclides da Cunha, saindo do modernismo carioca para o sertão de Canudos, inaugura esse processo intelectual de representação do sertão. Em Cândido Rondon, a viagem ao sertão é uma epopéia. Rondon, pelas representação que fazia de sua missão, se aproxima do “pioneirismo” bandeirante procurando se fazer passar não pelo cientista que era, mas pelo sertanista que construiu em si. Era um sertanista por lidar, em suas palavras, “há vinte anos ‘com as rudezas semibárbaras da linguagem dos caboclos e com as espertezas torturantes dos idiomas indígenas. Quanto a Oswaldo Cruz, contratado para proceder à profilaxia da malária grave entrave ao trabalhadores da ferrovia do diabo, o Hércules dessa missão concluiu que o Brasil era um grande hospital e que não podia haver progresso “onde as pessoas se contentam a vegetar sem melhorar as condições de sua vida. As representações comuns que essas missões fazem do sertão se faz a partir de cidades fantasmas –abandono –e da prevalecia da natureza sobre o homem –estado de natureza.
O sertão, analisando os relatos dos cientistas de maguinhos –o grupo de profilaxia nos trabalhos técnicos de desbravamento, incluindo aí Oswaldo Cruz –dão o sertão como um dado patológico. Na sua cruzada médica pela pátria destacam-se três idéias básicas: o sertão como doença –ancilostomose, doença de chagas e malária –as doenças da preguiça; o sertão abandonado pelas elites intelectuais e políticas, o que demonstravam a carência do sertanejo de carência e valores, e o sertão como símbolo da nacionalidade, numa recorrência tardia à questão do forjamento de uma identidade nacional. A estas questões introduz-se a relação entre raça e doença decorrendo daí o debate em torno da eugenia como perspectiva de melhoramento das novas gerações, traduzido na idéia do médico peruano Enrique Soldán para quem eugenizar seria sanear. Apesar de tudo, o sertão ainda resguardava a saúde moral em relação ao litoral contaminado pelos vícios –o que explica a vazão nacionalista que se procurava dar ao sertão.
Jeca Tatu é, portanto, o protótipo do sertanista: doente e preguiçoso, todavia, passível de cura com o remédio da civilidade. O Jeca Tatu é um “piolho da terra” –e certamente um homem que vive com piolho –cujo trabalho, quando o há, é rústico com conseqüente depredação da natureza. Terrível fazedor de desertos, o Jeca vive de qualquer jeito e nada o faz pegar à pena. O Jeca Tatu seria substituído por Mané Chique Chique, Jeca Leão e Jeca Bravo recuperados pelo sanitaristas. No meio do mato, Oliveira Viana ainda encontra tempo para distinguir o decorro pessoal das elites agrárias em oposição à baixeza da ralé rural.
Enfim, Nísia Trindade apresenta a transposição do debate sertanista da higienização à sociologia. Nesse âmbito o novo confronto se dá não mais entre litoral e sertão, mas entre civilização e cultura popular. Florestan Fernandes, recentido com a resistência do sertão à modernização apela para a presença do cientista social na promoção de uma mudança dirigida. O modo vida caipira e sua produção pré capitalistas precisavam ser superadas por uma sociedade moderna, o que requeria a presença do especialista social. É a anomia –ausência de respeito às normas –dos homens regidos pelos códigos do sertão, do homem estereótipo da indolência, que precisa ser superada.
Nesse ponto passemos à análise de “Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano”. A preferência pela análise conjunta, dentro de um mesmo tema é porque as duas obras se interpenetram e se completam. Homem é bipartido especialmente na obra de Souza Martins onde o conceito de fronteira é apresentado, sobretudo, na relação entre quem é humano e quem não é. Num viés espacial, a fronteira também é território disputado de diferentes modos por diferentes grupos; espaço onde as sociedades se formam, se desorganizam ou se reproduzem. Nas palavras de Souza Martins:
“Longe de ser o território do novo e da inovação, a fronteira se revela (...) o território da morte e o lugar de renascimento e maquiagem dos arcaísmos mais desumanizadores, cujas conseqüências não se limitam a seus protagonistas imediatos. Elas se estendem à sociedade inteira, em seus efeitos conservadores e bloqueadores de mudanças sociais em favor da humanização e da libertação do homem de suas carências mais dramáticas. A fronteira é, no fundo, exatamente o contrário do que proclama o seu imaginário e o imaginário do poder que muito freqüentemente se infiltra no pensamento acadêmico”. (p. 16).
O trabalho do autor, que leva-o à essa caracterização de fronteira resulta de pesquisa de campo elaborada em regiões de conflito agrário como Goiás, Mato Grosso, Pará, Maranhão e Rondônia. Nesse ambiente de conflito o “nós” é inviabilizado porque todo outro –o estranho –é também um inimigo numa relação onde há dominados e dominantes e, conseqüentemente vítimas e vitimadores e que, embora a metodologia científica constitua postura que requer imparcialidade, o pesquisador se põe na ótica da vítima como lado preferencial.
A frente de expansão é apresentada por Souza Martins como espaço de reprodução ampliada do capital onde o lado do “civilizado” vencedor incorpora a mitologia heróica do pioneiro em relação aos quais se produz conhecimento relegando o vencido, o indígena e seus pares ao desconhecido, ao esquecimento. A fronteira incorpora uma multiplicidade de movimentos e representações. Ela é, inclusive, definidora da modalidade do desenvolvimento capitalista em nossa sociedade. A esse respeito o autor defende que entre nós o capital depende acentuadamente da mediação da renda da terra para assegurar a sua reprodução ampliada. Disso, num país ainda agro-exportador, ninguém pode discordar. É essa a razão para que o capital, ou quem o representa, recrie, por meio da terra, “mecanismos de acumulação primitiva, confisca terras e territórios (...) atingindo violentamente as populações indígenas e (...) as populações camponesas”. (p. 30). Disso decorre a superexploração do trabalhador do que a escravidão por dívida é o seu maior exemplo.
A disputa no âmbito da fronteira geográfica perpassa a questão material da existência para adentrar no terreno do cultural. É com essa perspectiva que Martins analisa os raptos de mulheres e crianças nas fronteiras étnicas do Brasil. Esses raptos envolve uma concepção de pessoa e de humano entre índios e brancos. O rapto é configurado, segundo Souza Martins, como uma morte social e cultural. Fontes apresentam certa regularidade na prática de raptos e o que é importante a se considerar é que os raptos cumprem funções distintas nos distintos grupos e é definido em cada um a partir de esquemas de significados específicos. Souza Martins usa como amostra a análise de 120 casos de raptos indígenas e 26 praticados por “civilizados. O raptor indígena vê o raptado como um inimigo tornando tal inimigo raptado meio de intermediação com a “nova tribo”. Do lado civilizado o raptado, se homem, destina-se à escravidão; se mulher, à prostituição ou o concubinato –em ambos os casos, coisificação da pessoa. Do lado indígena, foi a invasão branca que intensificou a prática de raptos –que dentro do hábito indígena também atendia à necessidades de sobrevivência, pela ampliação, do próprio grupo –do lado do branco, desde os primórdios da colonização a caça ao índio já constituía garantia de mão-de-obra escrava.
Muitas vezes a expansão do capital é apresentado como projetos justificador das práticas assassinas, uma vez que o indígena se confunde com a natureza selvagem do sertão –para parafrasear Nísia Trindade –que precisa ser dominada pelos promotores do progresso. Nesse sentido, o rapto branco pode ser compreendido dentro de um projeto para amansar a natureza bravia, ou o índio selvagem que compõe essa natureza. Conclui o autor que tanto nos raptos “civilizados” quanto entre indígenas, o raptado era “mantido como outro (...) numa espécie de sala de espera do processo de humanização na perspectiva do raptor”. (p. 73).
A frente pioneira, ou frente de expansão do capital re-introduz no sertão um modelo de produção já ultrapassado e contestado: a escravidão. Nesse sentido, temos que admitir que a proposta não pode constituir relação com a modernidade tal qual a entendemos nos moldes iluministas. A peonagem, que caracteriza a escravidão por dívida –de que tanto fala padre Ricardo Rezende, proeminente pesquisador do tema na Universidade Federal do Rio de Janeiro –se organiza “segundo graus extremos e opostos de modernização”. Se estabelece, por essa realidade, uma situação complexa: de um lado o capitalista especulador, de uma fase pós-moderna do capitalismo, compra terras na Amazônia e passa a utilizar, para a reprodução do seu capital investido, modos escravista de produção, que corresponde historicamente a um modelo que Souza Martins se recusa a considerar pré-capitalista. Esse é, por exemplo, o caso dos investimentos do grupo Bradesco na região Sul do Pará, onde representando o lado especulativo do capital se adquiriu terras que, posteriormente, foram trabalhadas no sistema de peonagem.
A partir daí Souza Martins discorre sobre o papel do Estado enquanto agente patrocinador da política de expansão do capital, inclusive usando a força –do exército ditador –para impor a ordem vigente a peões insatisfeitos. Esse sistema sequer pode ser chamado de capitalista, para que assim o fosse seria necessário “a conversão de meios e situações não-capitalistas ou pré-capitalistas em instrumentos da produção capitalista propriamente dita” (p. 96). porque o que define a produção capitalista não é o resultado da produção, mas o modo como foi obtido tal resultado. No sertão comumente o resultado do trabalho tem sido capitalista, mas o modo de obter a riqueza não tem sido capitalista, tem sido escravista.
Fazendo ouvir a voz das crianças, depois de valorizar o silêncio dos que não falam, Souza Martins evidencia que para o caboclo o terra era o seu futuro e as migrações motivadas por uma propaganda governamental enganadora compreendiam essa esperança num futuro onde não há futuro se a terra é insuficiente. O trabalho na terra também compreende uma noção de melhoria de vida que, bem ao modo paulino de conceber o labor, nem se baseia na acumulação em si, mas na possibilidade de poder trabalhar, ser útil, existir. Para o capitalista, que também é um migrante, a terra não representa trabalho, o verbo preterido é ganhar.
Retomando a questão conceitual da fronteira, Souza Martins apresenta argumentos conclusivos dando conta que sociologicamente o mais relevante a se considerar sobre a fronteira é que ela constitui uma situação de conflito social. Esse conflito começa a ser explicado pelo jogo conceitual entre frente de expansão, tendo um sentido antropológico, e frente pioneira, de cunho geográfico. No que diz respeito aos antropólogos, o exemplo é Darci Ribeiro, fronteira da frente de expansão, é sobretudo a fronteira da civilização. A visão da frente de expansão é mais aberta, incluindo na expansão as classes marginalizadas que para li migram a procura de melhorias e reconhece as existentes como parte de um conflito a se desenrolar. Na frente pioneira, os geógrafos ignoram os miúdos, os excluídos. Para o geógrafo trata-se de uma fronteira econômica, enquanto para os antropólogos trata-se de uma fronteira demográfica.
A essa discussão o autor introduz a idéia de diversidade do tempo histórico. O choque do sertão com o moderno do litoral, menção à Nísia Trindade, pode ser entendido também por essas diferentes temporalidades. Cada realidade, esclarece Souza Martins, tem o seu próprio tempo histórico. O tempo do pequeno agricultor é diferente do tempo histórico do executivo do Bradesco. Essa compreensão certamente pode contribuir para a eliminação da fronteira enquanto limite do humano, situação da qual Martins diz que, para “além dela está o não-humano, o natural, o animal”. (p. 162). Outra relação interessante ocorre entre a frente de expansão e os movimentos milenaristas, como é o caso da Amazônia como o lugar mítico “das bandeiras verdes”, além destes o autor ainda identifica os seguidores de Padre Cícero e os peregrinos de Maria da Praia.
É, enfim, na esperança de um mundo melhor que estes grupos se juntam e criam uma realidade comum. Antevejo que na proposição de diferentes tempos históricos Souza Martins introduz o viés interpretativo para que não se fique apenas na crítica de um sistema capitalista que não é legítimo na sua forma de produzir riquezas. É claro que a diversidade de tempos não elimina a crueldade de um tal sistema, mas apresenta perspectiva para entendimento das diferentes realidades sem que para isso se tenha apenas a ideologia do vencedor determinadora dos outros povos como povos subjugados.
Conclusão
“o sertão é do tamanho do mundo”, essa expressão de Guimarães Rosa nos possibilita retomar a leitura de Bertran para valorizar a diversidade de um Brasil que não é um, mas que também não é dois. Um Brasil que, por ser diverso, deve ser dito de forma plural como pressuposto de reconhecimento, sobretudo, da diversidade cultural que o constitui. Esse é o caminho –se apresentar soluções for pertinente –de superação da bipolaridade entre litoral e sertão.
Essa polaridade sertão e litoral pode corresponde a representação já amplamente apresentada nesse blog a partir dos trabalhos de Stuart Hall, Koselleck, Halbwach e José de Souza Martins, dentre outros, onde prevalece sempre a oposição entre o eu e o outro, ou a representação que um grupo faz de si –base para a sua própria identidade de grupo –e a representação que faz do outro; representação cujo meio fundamental é a linguagem que, enquanto meio de exteriorização do mundo, se solidifica numa relação de poder sendo, assim, expressão de conflito social uma vez que a sua convenção corresponde à expressão do grupo dominante.
Os projetos de integração podem ser, comparativamente, analisados à luz do que acontece com a sociedade global em relação à globalização. Isso significa admitir um movimento cada vez mais forte de avanço dos modos de vida e de representação da realidade dos grupos dominantes sobre outros grupos onde o que não pode ser incorporado é veementemente negado. Em face desse quadro, como nos faz lembrar Tomaz Tadeu, em identidade e diferença, importa mais que a passividade do reconhecimento da existência desses conflitos e das diferenças, mergulhar nas raízes explicativas desses movimentos para a partir daí se descobrir o que melhor cabe a cada grupo dentro do seu contexto próprio.
Palavras-chave: fronteira, urbano, rural, eco-história.
Por uma questão metodológica prefiro iniciar pelo que poderia ser conclusivo, ou seja, diante do homem da fronteira que representa e que é representado numa contínua tentativa de centralização, apresentar a diversidade brasileira que, para Bertran, levando em conta em suas palavras, “nossa ecologia mínima” é constituinte do múltiplo, do complexo e do diversificado. Isso posto, levando em consideração o caso específico do homem do sertão brasileiro, há uma clara tendência de determinação do mesmo feito pelo homem urbano como se fosse uma regra a centralidade do urbano como representante dos valores civilizatórios de que padece o sertanejo. Assim, a introdução de Bertran já antecipa –embora prematuramente –a visão descentralizadora necessária à valorização do diverso.
Adentrar no íntimo dessa questão por ter um caminho facilitado a partir do apoio teórico fornecido pelas obras de Nísia Trindade, “um sertão chamado Brasil” e José de Souza Martins, “Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano”. A nossa primeira ocupação será da relação que há entre o trabalho de Nísia Trindade e a nossa proposição. Assim, na primeira parte da obra de Nísia Trindade ela dá conta que o tratamento intelectual dessa questão consiste no estabelecimento de uma noção de fronteira: o moderno x refratário. O litoral como área de modernidade e progresso e o sertão como resistência à força renovadora desse progresso.
Nesse primeiro momento a historiadora é muito bem sucedida na sua análise das relações sertão-litoral ao apresentar a noção de civilização e barbaria, o que evoca um campo de perspectiva mais amplo. O sertão, na sua resistência ao progresso incorpora uma noção ocidental de barbárie, enquanto o litoral mais aberto à modernidade –e pós-modernidade para citar Stuart Hall, representa o civilizado. Norbert Elias auxilia esse entendimento ao afirmar que civilização corresponde a uma auto-concepção que o Ocidente tem de si mesmo, sendo, portanto, essa uma diferenciação em relação aos povos subalternos –não civilizados. Esses argumentos põem o debate no plano da identidade e nesse sentido novamente retomamos o trabalho de Stuart Hall para quem a identidade na pós-modernidade é descentrada, múltipla e em transição. Assim, os intelectuais da elite percebem-se a si mesmo –e aqueles que representam –como ligados ao sentido universalista da modernidade; os outros –oprimidos e fracos –são matéria para as elaborações intelectuais como coisas que precisam ser interpretados –e se possível adequados.
Nísia aborda aquilo que chama de “representação geográfica da identidade nacional” (p.35). O que a Inglaterra foi para a Europa moderna, Os Estados Unidos da América se tornou para os povos latinos, a saber: uma referência de progresso e civilidade. Nessa relação a estudiosa recorre a Weber e Tocqueville para demonstrar como a sociedade norte americana era vista de forma positiva em oposição à barbárie dos povos latinos. A transposição dessa bipolaridade para o contexto brasileiro revela um conflito que envolve identidades e representações. O homem moderno –que antes de tudo integra a elite do país sempre no poder, mas especialmente no poder com a República –opõe-se ao não moderno que, essencialmente corresponde àqueles destituídos do poder e, geograficamente, afastados dos centros do poder, ou residente dos sertões.
Experiência e prejulgamentos correspondem a duas possibilidades de conhecimento corrente sobre o sertão. O próprio sentido etimológico –de sertão como deserto social e interior espacial –compreendem o ideário elaborado sobre o sertão, ideário esse que é base para pré-julgamentos em que o sertão figura como a antítese da ordem. Um outro dado comum a essa ideologia é a de sertão como área despovoada, como o semi-árido nordestino, o que, em verdade, configura fundamentalmente, a distância em relação ao poder. O sertão, portanto é o pólo que opõe o moderno ao atraso; estando, de outro lado, o litoral como o espaço da civilização onde, sobretudo, na leitura de Euclides da Cunha, prevalece a inautenticidade típica de uma sociedade moderna, aberta e receptiva ao novo e ao diferente. Em síntese apresentada por Nina Rodrigues, o litoral é o “reduto da civilização e dos grupos brancos” enquanto o sertão é o espaço “dominado por uma população mestiça, infantil, inculta, em estágio inferior da evolução social” (p. 60). Outra visão é a pintada pelos românticos e naturalistas, o que, resultado de relatos de viagens, Nísia chama de franksteiniano”. Nessa perspectiva, o índio é símbolo da nacionalidade e o sertanejo é um ser viturtuoso, de modo especial na literatura romântica.
O período republicano é de integração do sertão à nacionalidade e dentro dessa concepção integracionalista e de valorização promovem-se expedições desbravadoras como as de Cândido Rondon, Louis Cruls e do Instituto Oswaldo Cruz. Nessa proposta de integração do sertão José Bonifácio na Constituinte de 1823 propôs a construção de uma nova capital na região central do Brasil, ou seja, se propunha a interiorização da própria esfera do poder. O entendimento, porém, dessa concepção integracionista é bem apresentada por Nísia Trindade que diz:
O desbravamento do sertão pode ser visto como um movimento de forte conteúdo simbólico, que acompanhou os projetos oficiais de delimitação de fronteiras, saneamento, utilização de recursos naturais, povoamento e integração econômica. (p. 67).
A viagem de Euclides da Cunha, saindo do modernismo carioca para o sertão de Canudos, inaugura esse processo intelectual de representação do sertão. Em Cândido Rondon, a viagem ao sertão é uma epopéia. Rondon, pelas representação que fazia de sua missão, se aproxima do “pioneirismo” bandeirante procurando se fazer passar não pelo cientista que era, mas pelo sertanista que construiu em si. Era um sertanista por lidar, em suas palavras, “há vinte anos ‘com as rudezas semibárbaras da linguagem dos caboclos e com as espertezas torturantes dos idiomas indígenas. Quanto a Oswaldo Cruz, contratado para proceder à profilaxia da malária grave entrave ao trabalhadores da ferrovia do diabo, o Hércules dessa missão concluiu que o Brasil era um grande hospital e que não podia haver progresso “onde as pessoas se contentam a vegetar sem melhorar as condições de sua vida. As representações comuns que essas missões fazem do sertão se faz a partir de cidades fantasmas –abandono –e da prevalecia da natureza sobre o homem –estado de natureza.
O sertão, analisando os relatos dos cientistas de maguinhos –o grupo de profilaxia nos trabalhos técnicos de desbravamento, incluindo aí Oswaldo Cruz –dão o sertão como um dado patológico. Na sua cruzada médica pela pátria destacam-se três idéias básicas: o sertão como doença –ancilostomose, doença de chagas e malária –as doenças da preguiça; o sertão abandonado pelas elites intelectuais e políticas, o que demonstravam a carência do sertanejo de carência e valores, e o sertão como símbolo da nacionalidade, numa recorrência tardia à questão do forjamento de uma identidade nacional. A estas questões introduz-se a relação entre raça e doença decorrendo daí o debate em torno da eugenia como perspectiva de melhoramento das novas gerações, traduzido na idéia do médico peruano Enrique Soldán para quem eugenizar seria sanear. Apesar de tudo, o sertão ainda resguardava a saúde moral em relação ao litoral contaminado pelos vícios –o que explica a vazão nacionalista que se procurava dar ao sertão.
Jeca Tatu é, portanto, o protótipo do sertanista: doente e preguiçoso, todavia, passível de cura com o remédio da civilidade. O Jeca Tatu é um “piolho da terra” –e certamente um homem que vive com piolho –cujo trabalho, quando o há, é rústico com conseqüente depredação da natureza. Terrível fazedor de desertos, o Jeca vive de qualquer jeito e nada o faz pegar à pena. O Jeca Tatu seria substituído por Mané Chique Chique, Jeca Leão e Jeca Bravo recuperados pelo sanitaristas. No meio do mato, Oliveira Viana ainda encontra tempo para distinguir o decorro pessoal das elites agrárias em oposição à baixeza da ralé rural.
Enfim, Nísia Trindade apresenta a transposição do debate sertanista da higienização à sociologia. Nesse âmbito o novo confronto se dá não mais entre litoral e sertão, mas entre civilização e cultura popular. Florestan Fernandes, recentido com a resistência do sertão à modernização apela para a presença do cientista social na promoção de uma mudança dirigida. O modo vida caipira e sua produção pré capitalistas precisavam ser superadas por uma sociedade moderna, o que requeria a presença do especialista social. É a anomia –ausência de respeito às normas –dos homens regidos pelos códigos do sertão, do homem estereótipo da indolência, que precisa ser superada.
Nesse ponto passemos à análise de “Fronteira: a degradação do outro nos confins do humano”. A preferência pela análise conjunta, dentro de um mesmo tema é porque as duas obras se interpenetram e se completam. Homem é bipartido especialmente na obra de Souza Martins onde o conceito de fronteira é apresentado, sobretudo, na relação entre quem é humano e quem não é. Num viés espacial, a fronteira também é território disputado de diferentes modos por diferentes grupos; espaço onde as sociedades se formam, se desorganizam ou se reproduzem. Nas palavras de Souza Martins:
“Longe de ser o território do novo e da inovação, a fronteira se revela (...) o território da morte e o lugar de renascimento e maquiagem dos arcaísmos mais desumanizadores, cujas conseqüências não se limitam a seus protagonistas imediatos. Elas se estendem à sociedade inteira, em seus efeitos conservadores e bloqueadores de mudanças sociais em favor da humanização e da libertação do homem de suas carências mais dramáticas. A fronteira é, no fundo, exatamente o contrário do que proclama o seu imaginário e o imaginário do poder que muito freqüentemente se infiltra no pensamento acadêmico”. (p. 16).
O trabalho do autor, que leva-o à essa caracterização de fronteira resulta de pesquisa de campo elaborada em regiões de conflito agrário como Goiás, Mato Grosso, Pará, Maranhão e Rondônia. Nesse ambiente de conflito o “nós” é inviabilizado porque todo outro –o estranho –é também um inimigo numa relação onde há dominados e dominantes e, conseqüentemente vítimas e vitimadores e que, embora a metodologia científica constitua postura que requer imparcialidade, o pesquisador se põe na ótica da vítima como lado preferencial.
A frente de expansão é apresentada por Souza Martins como espaço de reprodução ampliada do capital onde o lado do “civilizado” vencedor incorpora a mitologia heróica do pioneiro em relação aos quais se produz conhecimento relegando o vencido, o indígena e seus pares ao desconhecido, ao esquecimento. A fronteira incorpora uma multiplicidade de movimentos e representações. Ela é, inclusive, definidora da modalidade do desenvolvimento capitalista em nossa sociedade. A esse respeito o autor defende que entre nós o capital depende acentuadamente da mediação da renda da terra para assegurar a sua reprodução ampliada. Disso, num país ainda agro-exportador, ninguém pode discordar. É essa a razão para que o capital, ou quem o representa, recrie, por meio da terra, “mecanismos de acumulação primitiva, confisca terras e territórios (...) atingindo violentamente as populações indígenas e (...) as populações camponesas”. (p. 30). Disso decorre a superexploração do trabalhador do que a escravidão por dívida é o seu maior exemplo.
A disputa no âmbito da fronteira geográfica perpassa a questão material da existência para adentrar no terreno do cultural. É com essa perspectiva que Martins analisa os raptos de mulheres e crianças nas fronteiras étnicas do Brasil. Esses raptos envolve uma concepção de pessoa e de humano entre índios e brancos. O rapto é configurado, segundo Souza Martins, como uma morte social e cultural. Fontes apresentam certa regularidade na prática de raptos e o que é importante a se considerar é que os raptos cumprem funções distintas nos distintos grupos e é definido em cada um a partir de esquemas de significados específicos. Souza Martins usa como amostra a análise de 120 casos de raptos indígenas e 26 praticados por “civilizados. O raptor indígena vê o raptado como um inimigo tornando tal inimigo raptado meio de intermediação com a “nova tribo”. Do lado civilizado o raptado, se homem, destina-se à escravidão; se mulher, à prostituição ou o concubinato –em ambos os casos, coisificação da pessoa. Do lado indígena, foi a invasão branca que intensificou a prática de raptos –que dentro do hábito indígena também atendia à necessidades de sobrevivência, pela ampliação, do próprio grupo –do lado do branco, desde os primórdios da colonização a caça ao índio já constituía garantia de mão-de-obra escrava.
Muitas vezes a expansão do capital é apresentado como projetos justificador das práticas assassinas, uma vez que o indígena se confunde com a natureza selvagem do sertão –para parafrasear Nísia Trindade –que precisa ser dominada pelos promotores do progresso. Nesse sentido, o rapto branco pode ser compreendido dentro de um projeto para amansar a natureza bravia, ou o índio selvagem que compõe essa natureza. Conclui o autor que tanto nos raptos “civilizados” quanto entre indígenas, o raptado era “mantido como outro (...) numa espécie de sala de espera do processo de humanização na perspectiva do raptor”. (p. 73).
A frente pioneira, ou frente de expansão do capital re-introduz no sertão um modelo de produção já ultrapassado e contestado: a escravidão. Nesse sentido, temos que admitir que a proposta não pode constituir relação com a modernidade tal qual a entendemos nos moldes iluministas. A peonagem, que caracteriza a escravidão por dívida –de que tanto fala padre Ricardo Rezende, proeminente pesquisador do tema na Universidade Federal do Rio de Janeiro –se organiza “segundo graus extremos e opostos de modernização”. Se estabelece, por essa realidade, uma situação complexa: de um lado o capitalista especulador, de uma fase pós-moderna do capitalismo, compra terras na Amazônia e passa a utilizar, para a reprodução do seu capital investido, modos escravista de produção, que corresponde historicamente a um modelo que Souza Martins se recusa a considerar pré-capitalista. Esse é, por exemplo, o caso dos investimentos do grupo Bradesco na região Sul do Pará, onde representando o lado especulativo do capital se adquiriu terras que, posteriormente, foram trabalhadas no sistema de peonagem.
A partir daí Souza Martins discorre sobre o papel do Estado enquanto agente patrocinador da política de expansão do capital, inclusive usando a força –do exército ditador –para impor a ordem vigente a peões insatisfeitos. Esse sistema sequer pode ser chamado de capitalista, para que assim o fosse seria necessário “a conversão de meios e situações não-capitalistas ou pré-capitalistas em instrumentos da produção capitalista propriamente dita” (p. 96). porque o que define a produção capitalista não é o resultado da produção, mas o modo como foi obtido tal resultado. No sertão comumente o resultado do trabalho tem sido capitalista, mas o modo de obter a riqueza não tem sido capitalista, tem sido escravista.
Fazendo ouvir a voz das crianças, depois de valorizar o silêncio dos que não falam, Souza Martins evidencia que para o caboclo o terra era o seu futuro e as migrações motivadas por uma propaganda governamental enganadora compreendiam essa esperança num futuro onde não há futuro se a terra é insuficiente. O trabalho na terra também compreende uma noção de melhoria de vida que, bem ao modo paulino de conceber o labor, nem se baseia na acumulação em si, mas na possibilidade de poder trabalhar, ser útil, existir. Para o capitalista, que também é um migrante, a terra não representa trabalho, o verbo preterido é ganhar.
Retomando a questão conceitual da fronteira, Souza Martins apresenta argumentos conclusivos dando conta que sociologicamente o mais relevante a se considerar sobre a fronteira é que ela constitui uma situação de conflito social. Esse conflito começa a ser explicado pelo jogo conceitual entre frente de expansão, tendo um sentido antropológico, e frente pioneira, de cunho geográfico. No que diz respeito aos antropólogos, o exemplo é Darci Ribeiro, fronteira da frente de expansão, é sobretudo a fronteira da civilização. A visão da frente de expansão é mais aberta, incluindo na expansão as classes marginalizadas que para li migram a procura de melhorias e reconhece as existentes como parte de um conflito a se desenrolar. Na frente pioneira, os geógrafos ignoram os miúdos, os excluídos. Para o geógrafo trata-se de uma fronteira econômica, enquanto para os antropólogos trata-se de uma fronteira demográfica.
A essa discussão o autor introduz a idéia de diversidade do tempo histórico. O choque do sertão com o moderno do litoral, menção à Nísia Trindade, pode ser entendido também por essas diferentes temporalidades. Cada realidade, esclarece Souza Martins, tem o seu próprio tempo histórico. O tempo do pequeno agricultor é diferente do tempo histórico do executivo do Bradesco. Essa compreensão certamente pode contribuir para a eliminação da fronteira enquanto limite do humano, situação da qual Martins diz que, para “além dela está o não-humano, o natural, o animal”. (p. 162). Outra relação interessante ocorre entre a frente de expansão e os movimentos milenaristas, como é o caso da Amazônia como o lugar mítico “das bandeiras verdes”, além destes o autor ainda identifica os seguidores de Padre Cícero e os peregrinos de Maria da Praia.
É, enfim, na esperança de um mundo melhor que estes grupos se juntam e criam uma realidade comum. Antevejo que na proposição de diferentes tempos históricos Souza Martins introduz o viés interpretativo para que não se fique apenas na crítica de um sistema capitalista que não é legítimo na sua forma de produzir riquezas. É claro que a diversidade de tempos não elimina a crueldade de um tal sistema, mas apresenta perspectiva para entendimento das diferentes realidades sem que para isso se tenha apenas a ideologia do vencedor determinadora dos outros povos como povos subjugados.
Conclusão
“o sertão é do tamanho do mundo”, essa expressão de Guimarães Rosa nos possibilita retomar a leitura de Bertran para valorizar a diversidade de um Brasil que não é um, mas que também não é dois. Um Brasil que, por ser diverso, deve ser dito de forma plural como pressuposto de reconhecimento, sobretudo, da diversidade cultural que o constitui. Esse é o caminho –se apresentar soluções for pertinente –de superação da bipolaridade entre litoral e sertão.
Essa polaridade sertão e litoral pode corresponde a representação já amplamente apresentada nesse blog a partir dos trabalhos de Stuart Hall, Koselleck, Halbwach e José de Souza Martins, dentre outros, onde prevalece sempre a oposição entre o eu e o outro, ou a representação que um grupo faz de si –base para a sua própria identidade de grupo –e a representação que faz do outro; representação cujo meio fundamental é a linguagem que, enquanto meio de exteriorização do mundo, se solidifica numa relação de poder sendo, assim, expressão de conflito social uma vez que a sua convenção corresponde à expressão do grupo dominante.
Os projetos de integração podem ser, comparativamente, analisados à luz do que acontece com a sociedade global em relação à globalização. Isso significa admitir um movimento cada vez mais forte de avanço dos modos de vida e de representação da realidade dos grupos dominantes sobre outros grupos onde o que não pode ser incorporado é veementemente negado. Em face desse quadro, como nos faz lembrar Tomaz Tadeu, em identidade e diferença, importa mais que a passividade do reconhecimento da existência desses conflitos e das diferenças, mergulhar nas raízes explicativas desses movimentos para a partir daí se descobrir o que melhor cabe a cada grupo dentro do seu contexto próprio.
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