Acredito que existem pessoas muito inteligentes e, ou, espertas que, por traço de personalidade, ou por livre escolha, não se envolvem com o seu contexto preferindo viverem apenas pra si. Mas a intelectualidade é diferente da mera esperteza. Entendo que é exatamente o envolvimento com a realidade social acompanhado de argumentos razoáveis e de um comprometimento livre e especialmente consciente, que caracteriza o homem que mais que inteligente é intelectual. Estou convicto, portanto, de que não pode haver intelectualidade na esterilidade; não consigo aceitar o fato de que alguém possa ser intelectual e viver apenas para si.
Desconsiderando parte das teorias inatistas, seja de Platão, ou de John Locke, eu creio ser o espaço acadêmico o mais profícuo não só para o florescer intelectual, quanto para o correto encaminhamento dessa virtude em direção do seu fazer prático. Pensar dessa forma requer, necessariamente, uma crítica sobre as atuais circunstâncias em que se encontra o sistema de ensino brasileiro. Os últimos 10 dez anos foram marcados por uma sensível mudança no raciocínio político brasileiro. Pressionados pelos organismos internacionais, os dirigentes brasileiros intensificaram a matemática da educação e começaram a criar meios de "melhorar os números". O resultado disso foi a proliferação de cursos à distância, cursos de licenciatura ditos popularmente "parcelados" em que pouco se estuda e menos ainda se aprende e outros programas "educacionais" em nível fundamental, médio e superior visando maquiar a deficiência do sistema educacional brasileiro assim fazer parecer mais eficiente aquilo que está putrefato.
No Estado de Goiás o símbolo dessa pobreza é a Universidade Estadual de Goiás, UEG, a qual foi objeto específico de um artigo que escrevi intitulado "Universidade do Engodo", cujo, provocou mal-estar em muitos acadêmicos porque viram ferida sua vaidade e por querem um diploma limpo, limpo inclusive do crivo da minha crítica. Mas é forçoso, até para estes, ante os fatos que se apresentam, admitir a inviabilidade da UEG como espaço formador-intelctual quando, na verdade, não tem superado, em ensino, os fundamentos básicos da educação elementar –quem discordar entreviste um recém-formado dos cursos parcelados –enquanto espaço de cidadania, há uma grande razão para se pensar criticamente sobre o seu papel, neste caso, da atuação da UEG no campo da cidadania, seria suficiente demonstrar, para evidenciar sua fragilidade, o processo eleitoral para os maiores cargos: reitor e presidente do DCE. É escandaloso saber que nessa universidade o "reitor-dono" se candidate a uma cadeira no Congresso –de cara já queria ser deputado federal –e, contrariando a lei eleitoral, use a instituição como palanque. Infelizmente foi o que se notou nas visitas de pessoas que exercem função de destaque na UEG a cada unidade propagando a importância do José Izecias tanto no processo de gestação da UEG como da sua melhoria no correr dos anos e, consequentemente, o quanto, estrategicamente, seria interessante que esse "bom pai" pudesse defender a UEG ("filha bastarda") num plano maior, no plano nacional, ou, dito de outra forma, no Congresso Nacional.
Nós, acadêmicos e professores, vimos e ouvimos e nada dissemos. Isso é a intelectualidade estéril. Nestas circunstâncias eu, geralmente, fico inconformado. Mas igualmente me faço estéril por nada fazer.
Sartre, em um belo discurso sobre literatura, diz que "o escritor sabe que a palavra é ação e sabe que desvendar é mudar e que não se pode desvendar senão tencionando mudar", reforçando sua defesa do engajamento intelectual ele conclui que "a função do escritor é fazer com que ninguém possa ignorar o mundo e considerar-se inocente diante dele". O verdadeiro intelectual, para Sartre, é aquele engajado com seu contexto; é o intelectual orgânico de Gramsci, é o intelectual que não é estéril. O falso intelectual é o estéril o qual Paulo Freire acusa de, no meio acadêmico, promover a dissociação entre o real e o meramente discursivo. De forma sintetizadora, o professor Antônio Ozai da Silva, professor da Universidade Estadual de Maringá, define o papel do intelectual como sendo o de: "arrancar os homens e mulheres da sua consciência feliz, isto é, da sua ignorância perante o mundo"; do que podemos finalmente concluir que o sentido da literatura deverá ser sempre contemporâneo.
De fato, eu não saberia dizer em que medida a Universidade Estadual de Goiás pode, tal como se encontra, contribuir efetivamente para o brotar intelectual de seus acadêmicos ou de seus professores. É lamentável ver pessoas se formando sem que tenham pelo menos aprendido escrever um texto com concordância, ou na ausência dessa, que tenha um sentido lógico e apresente uma idéia própria. É lamentável, sobretudo, que essa ocorrência, de semi-analfabetos funcionais diplomados seja bem mais freqüente que a ocorrência de formandos com espírito crítico que lhes permitam um mínimo de autonomia intelectual.
Frente ao que se apresenta fica fundamentado que a nossa maior esterilidade é intelectual. Nos faltam intelectuais para contestar as bases mantenedoras desse sistema degradante que se formou em torno da nossa universidade e de muitas outras. Nós não temos nem entre os acadêmicos, nem entre os docentes qualquer organização que lute por qualquer direito, mas, por outro lado, nossa alienação não é opcional, como o fazem os anarquistas, nossa alienação, em que pese dizer isso, é fruto da nossa ignorância, e somente dela.
O intelectual de Giroux, apresentado em sua obra "Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem" é mediador, legitimador e produtor de idéias e de práticas sociais; que bom seria se os docentes da UEG fossem intelectuais e se formassem acadêmicos intelectuais.
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